Arquivo da tag: Memória

O Homem que Lembrava de Tudo.. Memória – Parte II/II

 

clip_image001

Primeiro uma histórinha!

Tente usar toda sua imaginação para realmente visualizar isso enquanto lê!

Você acaba de chegar na sua casa, e quando vai abrir o portão e tem um homem bem gordo lendo um Jornal. Quando ele baixa o jornal, você nota que ele tem 2 cabeças! Uma com todos os dentes, outra sem nenhum, e as duas sorriem para você enquanto ele acena o jornal.

Você passa por ele e vai para a porta da sua casa, lá tem uma Teia de aranha gigante onde estão presos a Angelina Jolie e o Brad Pitt pedindo socorro! Eles se contorcem, mas a teia é forte demais!

Você solta apenas um deles (escolha), só que a roupa fica presa e ela (ou ele) então sai pelada correndo para dentro da casa. Você vai atrás e a (ou o) encontra pelada montada na CPU do seu computador, com o monitor embaixo de um braço e girando o mouse pelo fio com a outra mão enquanto grita “Yiiiiiiiiiiihaaaaaaaaa!!!!”

Você continua caminhando para a sua cozinha e quando chega nela encontra o Aladdin na Janela. Ele aponta diz “Essa cozinha não é grande coisa, mas a vista é maravilhosa!” Você olha pela Janela da sua cozinha e vê de longe o Palácio de Agrabah! Dentro do Palácio o Macaquinho Abu está comendo maçãs no Jardim, debaixo de uma tenda de frutas! O Abu come a pilastra de Maçãs, e a tenda desaba sobre ele. Espira um pouco de suco de maçã no teu rosto, consegue sentir o cheiro?

–//–

Sem olhar nas suas fotos, diga-me: Qual roupa você usou na noite de 18 de Outubro de 2009? Qual foi o sabor do seu bolo de aniversário de 12 anos? E qual foi seu presente preferido no Natal do ano retrasado?

Pois bem, se você é normal você não soube de imediato a resposta exata de absolutamente nenhuma pergunta. Mas, uma coisa legal da genética é que variações ocorrem e várias pessoas anormais nascem. Na maior parte das vezes, nada notável… nas outras partes mutações para pior.. Ou melhor!

Foi em um desses acasos da natureza que nasceu na Russia por volta de 1880 o singular Solomon S. Um fato interessante sobre pessoas extraordinárias é que as vezes elas nem percebem que assim o são, e presumem que seu talento é nada mais que normal 🙂

Em um dia normal em seu trabalho como Jornalista, o jovem Solomon participou de uma reunião junto com seu time, onde seu Chefe listou para eles nomes e telefones de possíveis fontes de informações. Ao perceber que Solomon não copiava nada, Seu chefe irritou-se e, ao final da reunião, chamou o Sr. S para a xinxa, reclamando que ele nunca tomava notas, sendo isso inaceitável para um jornalista.

Seria ele tão arrogante a ponto de não precisar de fontes para escrever suas matérias? Solomon replicou que ele na verdade não entendia o porque as pessoas “tomavam notas”. Qual era o objetivo se elas poderiam simplesmente lembrar de tudo? Solomon então contou ao seu chefe exatamente tudo, nomes e telefones, palavra a palavra, o que eles haviam conversando em suas últimas reuniões.

Por mais incrível e fora do normal que isso pareça, o Gerente conseguiu enxergar o talento de seu funcionário, e o encaminhou para um Psiquiatra. O distinto Professor Luria, que trabalhava com pessoas com danos cerebrais e/ou talentos especiais, como os do Sr. S.

Bem.. vamos direto para a parte que aqui nos interessa (embora eu recomende muito a leitura do Moonwalking with Einstein e esse artigo sobre o Solomon Alegre )

Sinestesia (Syn: União, Junção + Esthesia: Sensação) é uma condição especial neurológica onde os nossos diferentes sentidos se unem. Para nós mortais é um pouco difícil de imaginar isso, mas imagine que ao ouvir a palavra Verde você automaticamente visualize a Cor, se lembre do cheiro de grama, e seu leve toque nos seus pés descalços. É mais como uma confusão de sentidos, e Luria identificou que Solomon era justamente um sinestésico.

Isso é um fato essencial para entendermos como o garoto lembrava de tudo. Lembra-se do post anterior onde falamos um pouco mais sobre os neurônios? Lembre-se que eles se juntam formando redes densas e interconectadas onde ficam “pistas” das memórias em diversas partes do cérebro. Sabe quando você está tentando lembrar de algo e sente que está “na ponta da língua”? Que você tem certeza que sabe.. Mas… precisa… lembrar!!!! Pois bem, você está na Pista certa, mas há alguns neurônios de distância ainda Smiley piscando 

O jeito mais fácil de se lembrar das coisas é misturar os sentidos… juntar informações marcantes que façam seu cérebro classificar aquela informação como algo excepcional, e não um fato ordinário. Solomon lembrava de tudo porque, para ele, tudo era especial (no entanto o pobre garoto ficaria a eternidade tentando sem sucesso entender metáforas, figuras de linguagem, e etc).

Alguns estudos apontam que as memórias são divididas em nosso cérebro (simplificando) em “de longo prazo” e “de curto prazo” ou como “fatos memoráveis” e “fatos corriqueiros” .. Meio que igual um computador. Nós temos o HD com um vasto espaço onde nós guardamos nossos arquivos para acessar mais tarde quando necessário. Ao mesmo tempo, há a memória RAM, aquela que usamos para guardar os arquivos com os quais estamos lidando agora. E estudos demonstram que os humanos tendem a vir de fábrica com a RAM razoavelmente semelhante Alegre 

O grande segredo para memorizar as coisas é torná-las memoráveis, e entender para o que nossa memória funciona melhor! Nossa memória é ÓTIMA para lugares, imagens, coisas engraçadas, e pornografia! Um dos segredos dos Atletas da Memória é forçar uma sinestesia com essas coisas no seu Palácio da Memória. Mas o que é esse palácio?

Na Grécia antiga, várias pessoas enconimagetravam-se em um prédio, sentadas às suas mesas conversando. Em uma das mesas, um Cidadão aprecia a conversa com seus colegas quando é chamado à porta para receber um mensagem. Ao cruzar a soleira, eles ouvem um alto ruído, e o palácio desmorona, matando todos que lá estavam. Em choque e surpreso por ter escapado da morte por alguns segundos, ele observa. Observa as pessoas chegando para ajudar… Alguns escombros sendo removidos e familiares das vítimas tentando desesperadamente encontrar seus corpos. O Cidadão fecha os olhos e, de repente o cenário muda. Ele está de volta ao palácio, que ainda está de pé. Ele identifica os colegas e onde estavam sentados. Ele escuta o som das taças, sente o cheiro do vinho. Ele abre os olhos novamente, e, um a um, guia os familiares aos exatos lugares onde as vítimas estavam.

Foi assim, nesse trágico cenário de morte, que nasceu o Palácio da Memória. O intuito aqui, é que você crie o seu próprio palácio, e lá guarde as informações que deseja.

O Palácio da Memória é uma técnica que foi empregada em uma época diferente da nossa. Hoje o conhecimento é Externo e nós só precisamos Acessá-lo. Quer saber a distância da Terra à Lua? Acesse o Wikipedia e veja! Mas e antes do Wikipedia? E antes dos livros? Como as pessoas guardavam, acessam, e passavam adiante os conhecimentos? Com o palácio da memória.

Por mais que a técnica não seja mais de conhecimento geral hoje, muitas coisas que usamos no dia a dia remetem a ela. Por exemplo, os Tópicos que você aborda nas suas apresentações… Tópico tem origem na palavra Topos, que significa: Lugar.

Ou a frase “Em primeiro lugar, bla bla bla, e em segundo lugar, y y y!”. “Em primeiro lugar” é uma referência ao uso do palácio da memória, onde você guarda no primeiro “lugar” aquilo que não quer esquecer, e precisa falar primeiro. Em uma apresentação, por exemplo, precisamos lembrar os Tópicos que queremos abordar, e discorrer sobre eles de acordo com o que lembramos na hora. Seria impossível e/ou insosso decorar a apresentação inteira, e simplesmente repeti-la, então nós decoramos os tópicos que precisam ser apresentados, e falamos o que sabemos sobre eles.

Por exemplo, a histórinha do começo desse post é para lembrar de um MUTAÇÃO e um JORNALISTA, lembrar da TEIA GIGANTE que nossos neurônios formam, de como nossa memória as vezes se assemelha à de um COMPUTADOR, e também de falar sobre o PALÁCIO DA MEMÓRIA.

E você… O que acha dessa história toda?

“Bom, em primeiro lugar…”

Alegre

Eu ia postar, mas…. esqueci.. Parte I

Ah, a memória! Um campo de estudo magnífico que leva maridos e mulheres a brigarem ao redor de todo o mundo desde os primórdios da civilização (ou não). Imagine a jovem Maria, grávida de Jesus, pede à José que busque Pão, Água, e algumas frutas. Maria grávida, com algumas dores espera por horas até que José volta com Pão e Frutas.

image– Cadê a água, José? – Diz Maria

– Aiihh…. Esqueci da Água! Sabe o que é? Quando eu comprei as frutas eu ouvi um pessoal falando de um boato que um doido ai vai começar a mandar matar crianças e…

– VOCÊ ESQUECEU A MINHA ÁGUA? Não adianta vir com suas desculpas, você sempre inventa alguma coisa para justificar essa sua memória! O Problema é que você não presta atenção em nada e….

E assim vai. Se isso nunca aconteceu com você, com um amigo, um primo, um vizinho, tenho certeza que você ao menos já ouviu falar de uma história semelhante. image

Bom, isso faz a gente querer entender um pouco melhor a memória, não? Qual a diferença real entre a mulher que sempre chega na frente da geladeira e pensa “o que eu ia pegar mesmo?” e aquela que decora a sequência de cartas de um baralho inteiro em menos de 2 minutos? O que é a nossa memória, afinal?

Foi justamente buscando essas respostas que o Jornalista Joshua Foer escreveu o livro Moonwalking with Einstein, contando sua jornada como um cara normal que sempre esquece onde deixou as chaves do carro, enviado para cobrir o campeonato de Memória Americano e Europeu, seu treinamento, e no ano seguinte a sua vitória como Campeão Americano de Memória.

UAU!! Como isso é possível? Estudar a memória e como ela funciona (como sempre) é o começo para entender como otimizá-la.

Primeiro temos que entender que a memória é uma coisa viva. Afinal, como se forma uma memória? Conjuntos de Neurônios se organizam em determinada parte do cérebro, se unem e formam uma memória. Nós tendemos a achar que as memórias são como “fotos”, imutáveis retratos da realidade, confiáveis e evidências decisivas. Na verdade as memórias são mais como uma peça de Teatro, cada vez que a acessamos nós a “revivemos” e incluímos nela alguma informação a mais de acordo com nossa realidade atual (ou apagamos outras) de modo que aquela sua memória preferida de infância, que você se lembra todo aniversário há mais de 20 anos, possivelmente já foi tão alterada que pouco lembra a realidade Alegre Isso coloca sérias dúvidas sobre testemunhas oculares, não é?! E isso também torna possível o plano da Pílula do Esquecimento.

imagePara quem conhece os neurônios, sabe que uma das coisas mais legais a respeito deles é que eles se ligam a vários outros formando uma rede densa e complexa com inúmeras possibilidades. A beleza disso para as memórias é que uma coisa se liga a outra, meio que deixando pistas, e as vezes você começa a pensar na casa da sua avó, ai lembra que ela tinha um cachorrinho que você adorava… qual o nome dele mesmo? Sucata! Isso te faz lembrar que seu tio João vende sucata no ferro-velho dele, e ele comprou um motor velho de geladeira do seu pai uma vez… aliás, seu pai precisava passar na sua faculdade e pegar o seu diploma da Pós para você levar ao seu chefe! Lembra que ele tinha dito que te daria uma promoção depois que você se formasse?! Então é isso ai, agora você vai receber um aumento e vai poder ir para a Itália! Ahhhh, o coliseu!!!! … Mas espera ai… como diabos a gente saiu da casa da Vó, para o Coliseu? Como você não sabe que no seu cérebro está tudo associado você solta um “ahh… é porque é tudo coisa velha!” Alegre

A memória representa anos e anos de evolução. Se você é um Criacionista não vai levar isso em consideração, mas grande parte das evoluções que tornaram (ou encaminharam) nosso organismo no que ele é hoje se deram no período Paleolítico, há mais de 2 milhões de anos atrás! Isso serve para refletirmos em várias áreas, como memória, alimentação, comportamento, entre outros. No futuro falaremos mais de alimentação e comportamento, mas agora vamos focar na memória!

Bem, nessa época começaram a aparecer as primeiras espécies de HOMO (nós somos o Sapiens). Agora, imagine por um momento o dia-a-dia na Idade da Pedra Lascada (ou até mesmo da Polida) e se pergunte: “o que era importante aos nossos ancestrais lembrarem?” Seria o telefone da Pedrita? Nope.

Nessa época a memória essencial para a sobrevivência era a de onde você viu algum alimento, quais plantas eram comestíveis ou não, se aquele movimento nos arbustos era bom ou ruim, entre outros. Saber essas coisas significava a diferença entre viver (e passar seu código genético adiante) ou não. Darwin explica.

Você sabia que em uma fração de segundos nós decidimos se uma pessoa é uma ameaça ou não? Em uma fração de segundos reconhecemos o movimento na relva como uma onça espreitando, ou que tribos indígenas conseguiam reconhecer quais plantas eram comestíveis, curativas, venenosas ou não sem nunca ter escrito um livro a respeito?

Nossa memória é linda. É ótima! Mas talvez não seja a ideal para o mundo atual. Nós mudamos de um paradigma onde precisávamos lembrar e reter conhecimento para outro onde o conhecimento é externo e nós meramente o acessamos quando necessário. Afinal, para que lembrar os primeiros dígitos da sequência de Fibonacci se você pode simplesmente pesquisar no Bing agora mesmo?

O que os Homo Sapiens fazem muito é achar que os acontecimentos da sua vida e da de seus pais são o Natural, é a História. Pois saiba que 200 anos de história da sua família representam menos de 0,01% da história de nossa espécie e seus ancestrais. O que nós fizemos nos últimos 20.000 anos pode muito bem ser uma coisa nada natural para a nossa espécie e isso geralmente causa problemas que não conseguimos entender.

“… bom… beleza então… nossa memória é um lixo e o jeito é viver como homens das cavernas ou se conformar…” Não.

Agora nós sabemos um pouco melhor do que criou nossa memória e algumas coisas que a influenciam. Conseguimos identificar os erros e, assim, desenvolver métodos para mitigá-los ou, se possível, eliminá-los! E é exatamente isso que veremos no próximo post.

imageOutra coisa importante da memória é que esquecer também é essencial. Em estudos genéticos feitos com ratos, foi identificado e isolado o Gene responsável pela memória. Cientistas criaram o Super Mouse da memória (para mais, leia o Livro de Michio Kaku) com uma memória superior. Isso significa que ele dominava tudo mais rápido, lembrava os caminhos dos labirintos como ninguém, uma maravilha!

Maravilha… tirando o fato de que ele lembrava de tudo muito bem. Se um dia ele esbarrou em um fio e levou um choque, ao simplesmente ver um fio ele já lembrava do choque. Mas a lembrança era tão real que ele paralisava, como se estivesse revivendo o choque.

A Natureza é realmente uma força maravilhosa. Talvez a seleção natural tenho decidido que nós somos os mais aptos a sobreviver. Lembramos bem de nossos amores, nossas bençãos. Esquecemos onde deixamos as chaves, os nomes de alguns primos distantes, mas também esquecemos nossas ofensas, nossos traumas. Nós lembramos o suficiente para vivermos, e esquecemos o suficiente para sermos felizes. Uma ótima medida!